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Conselho de Direitos Humanos recomenda afastamento de Secretário por crise no socioeducativo do Ceará

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O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) emitiu resolução recomendando o afastamento oficial de Josbertini Clementino, titular da Secretaria de Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS) do Ceará. A deliberação é resultado do descumprimento das medidas emergenciais, cabíveis à pasta, para solução da crise do Sistema Socioeducativo do Estado, bem como da avaliação de que a atuação do Secretário “descumpre as normas legais e atenta contra a prevalência dos direitos humanos”.

No documento, o colegiado composto por entes públicos, tais como Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), por órgãos governo federal e por entidades da sociedade civil destaca que “é inconcebível que o Estado do Ceará conviva com situação de tamanha gravidade, inclusive com a morte de um adolescente motivada por conflito em uma unidade do sistema e denúncias reiteradas de tortura, sem uma ação efetiva de reconhecimento e solução do problema”. O Secretário é responsável, desde 2013, pela Coordenação de Proteção Social Especial – Gerência do Sistema Socioeducativo.

Em reunião realizada nos dias 12 e 13 de maio, o CNDH também aprovou relatório final sobre sistema socioeducativo do Ceará, no qual registra o agravamento da crise, com a ocorrência de rebeliões e fugas; a perpetuação de problemas de gestão e execução da política pública e a exacerbação da violência física e psicológica contra os jovens que cumprem medidas socioeducativas. Diante desse quadro, o relatório recomenda diversas ações ao Executivo Nacional e Estadual, ao Poder Judiciário Estadual, ao Ministério Público Estadual e à Defensoria Pública do Ceará. Os órgãos serão notificados pelo Conselho a partir desta terça-feira (17).

Entre as medidas recomendadas, estão: reestruturação da gestão e da prestação dos serviços nas unidades, com garantia da administração direta por parte do Poder Executivo Estadual e abolição do sistema de parcerias com entidades privadas; contratação imediata de 450 profissionais socioeducadores; estruturação da carreira e realização de concurso público; e oferta de apoio psicopedagógico aos trabalhadores do sistema. Com vistas à imediata garantia dos direitos dos adolescentes, pede abolição do isolamento compulsório; oferecimento de cursos regulares de ensino fundamental e médio e realização de obras de construção de unidades de internação.

Diante das violações constatadas, o CNDH requer ainda apuração rigorosa das denúncias de tortura e maus-tratos, com afastamento e responsabilização de agressores e reparação às vítimas; instauração de procedimento especial para analisar as planilhas de orçamento e custos dos convênios com entidades privadas executoras do atendimento socioeducativo, além da apuração, por parte do Judiciário, das causas do quadro de violações, com posterior responsabilização.

As medidas emergenciais foram sugeridas pelo CNDH após acompanhamento, nos últimos sete meses, da situação do sistema socioeducativo do Ceará. Em outubro, o Conselho instalou grupo de trabalho específico para tratar do tema, o qual realizou missão para inspecionar a situação, em novembro. Após a constatação da gravidade das violações de direitos humanos, o colegiado apresentou relatório preliminar em que já recomendava diversas ações. A maior parte delas, contudo, não foi cumprida. De acordo com o relatório final, houve não a solução dos problemas, mas “o agravamento da crise, com irrecuperáveis danos aos adolescentes internos, aos profissionais que trabalham nas unidades e à sociedade, tendo em vista a convivência com um sistema violador e promotor de violências, bem como o volume de recursos públicos destinado a uma política que não tem se mostrado efetiva”.

Histórico da crise no Socioeducativo

A ocorrência de graves violações aos direitos humanos nos centros socioeducativos também foi reconhecida por outros órgãos de monitoramento, como o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT). Após denúncia feita em 2015, decorrente do agravamento de episódios continuados de violência aos adolescentes internos, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) notificou oficialmente o governo brasileiro e concedeu as medidas cautelares.

De acordo com o regulamento da CIDH, o mecanismo de medidas cautelares é utilizado em situações de gravidade ou urgência e a decisão pela medida se dá, unicamente, a partir da análise de situações que possam significar um dano irreparável às pessoas. Os episódios mais críticos dessa crise chegaram a resultar na morte de um adolescente, em novembro de 2015, e atos de torturas e tratamentos cruéis, desumanos e degradantes; isolamento prolongado e até supostos abusos sexuais; em fugas de grandes proporções e destruição de Unidades de Internação.

O ano de 2016, mais crítico do sistema, já acumula mais de 60 episódios conflituosos – entre rebeliões, motins e fugas -, somando 178 adolescentes foragidos.