Foi concluída na última quinta-feira, 17, a visita ao Brasil da Relatora Especial da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre direitos dos Povos Indígenas, Victoria Taulli-Corpuz. Em seu último compromisso no país a Relatora apresentou, em entrevista coletiva, suas impressões a respeito da situação dos povos indígenas e expôs uma prévia das recomendações.
A Relatora da ONU iniciou saudando a atuação da rede de organizações da sociedade civil que auxilia os povos indígenas na afirmação de seus direitos e a criação da Relatoria de Direitos Humanos e Povos Indígenas da Plataforma de Direitos Humanos – Dhesca Brasil.
Victoria manifestou sua preocupação com os retrocessos nos direitos dos povos indígenas no Brasil e com a violência e as graves violações que vêm ocorrendo. Entre as principais recomendações da Relatora estão: medidas imediatas devem ser tomadas para garantir a segurança das lideranças indígenas e concluir as investigações sobre os assassinatos; redobrar os esforços para assegurar a demarcação de terras indígenas; fortalecer a Fundação Nacional do Índio (Funai); implementação do direito à consulta prévia, conforme estabelece a convenção 169 da OIT e a Declaração da ONU sobre os direitos dos povos indígenas; o Estado deve reconhecer e apoiar as medidas que vêm sendo tomadas por povos indígenas para exercer seus direitos na prática em conformidade com seu direito à autodeterminação; possível criação de um Inquérito Nacional para investigar as violações que os indígenas vêm sofrendo e oferecer reparações.
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Audiência com a Sociedade Civil

Erika Yamada, Relatora de Direitos Humanos e Povos Indígenas da Plataforma Dhesca, também esteve presente nas audiências que a Relatora da ONU realizou com representantes da sociedade civil no dia 8 de março. Erika apresentou a Relatoria e falou sobre os focos de atuação, que são o debate sobre o direito de consulta (a partir da realidade do Tapajós, no Pará) e a demarcação de territórios indígenas, com destaque para a situação dos indígenas do sul do país. Demonstrou, ainda, preocupação com a situação da região entre Roraima e o Amazonas, onde linhas de transmissão estão sendo construídas.
Entre as questões apresentadas pelas organizações de direitos humanos presentes nas audiências estão:
- Política ambiental brasileira com viés de racismo de Estado;
- O conflito no sul da Bahia (terras federais) e o processo de reintegração de posse;
- Ação articulada entre os três poderes para retirar direitos dos povos indígenas: executivo não demarca e está sucateando a Funai e Incra; legislativo com Projetos de Lei e criação de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs); judiciário atuando conta indígenas e o debate sobre o marco temporal;
- Importância da Comissão de Direitos Humanos da ONU na investigação dos impactos do neodesenvolvimentismo nos povos indígenas;
- Criminalização dos movimentos sociais e defensores de direitos humanos;
- Fragilidade do programa de proteção aos defensores de direitos humanos e da impunidade no caso dos assassinatos
- Retrocessos especialmente com a reforma ministerial que uniu Secretaria de Políticas Públicas e Igualdade Racial, Secretaria de Políticas para as Mulheres e Secretarias de Direitos Humanos em um só Ministério;
- Fragilidade dos recursos destinados às políticas de direitos humanos, com redução de 30% dos recursos da Funai, 56% da Secretaria de Direitos Humanos e 44% para demarcação de terras indígenas;
- O tema da alimentação adequada está diretamente relacionado às políticas destinadas aos povos tradicionais;
- Violação do direito de consulta, como no caso do Tapajós;
- Inversão do ônus da prova contra os povos indígenas, que acabam tendo que provar seus direitos.
O relatório sobre a visita e as recomendações feitas pela Relatora Victoria Taulli-Corpuz constarão em seu relatório final, que será divulgado em setembro.